“O currículo para a consolidação de uma educação emancipatória e culturalmente sensível.”
Marcos A. C. Pimentel
“a diversidade cultural é a riqueza da humanidade. Para cumprir sua tarefa humanista, a escola precisa mostrar aos alunos que existem outras culturas além da sua. Por isso, a escola tem que ser local, como ponto de partida, mas tem que ser internacional e intercultural, como ponto de chegada. (...) Escola autônoma significa escola curiosa, ousada, buscando dialogar com todas as culturas e concepções de mundo. Pluralismo não significa ecletismo, um conjunto amorfo de retalhos culturais. Significa sobretudo diálogo com todas as culturas, a partir de uma cultura que se abre às demais.” (Moacir Gadotti)
Ah, essa juventude!
Não é para desprezar a grande diversidade que encontramos em cada esquina. Jovens adolescentes com sua diversidade cultural. Trejeitos, adornos pelo corpo que virou moda entre eles dada a grande massificação dos piercing no umbigo, encravada nas orelhas, língua, nos supercílios, no nariz entre outras partes. Eis aí um jovem adolescente que carrega consigo essas características físicas e a reboque um linguajar que difere a todo o instante dada a dinamicidade dos meios de comunicações encarregados de disseminar o diferente impactante, que projeta, que coloca em evidência as práticas que gerarão um novo mercado de consumo. É desse jovem que ainda na adolescência que opta por querer ser professor ou professora que queremos refletir. Esse ser que ainda adolescente é aprovado para entrar em sala de aula e passar conhecimentos que por sua vez teve como seu professor outro que não coaduna com o seu tempo; com as suas características culturais, que a todo o momento é alvo de sedução por ser ele um produto ainda a ser alcançado, pois dele poderá extrair e incutir idéias mais inovadoras.
A Organização Mundial da Saúde classifica a adolescência dentro da faixa etária entre 10 e 19 anos, já o Estatuto da Criança e do Adolescente classifica a adolescência a faixa etária que vai de 12 até os 18 anos, onde acontecem diversas mudanças físicas, psicológicas e comportamentais. Outras classificações são feita como, por exemplo, este parâmetro já apresentado, contudo indo até 20 anos e dividido em três distintas etapas: a pré puberdade onde se dá a aceleração abrupta no crescimento; a puberdade marcada pelo crescimento dos órgãos reprodutores e onde o lado emocional é muito confuso e a pós-puberdade entre quinze e vinte anos onde a cobrança à responsabilidade será intensamente cobrada e as escolhas sobre sua situação profissional, entre outras nortearão a vida neste final de fase de vida.
Temos aí um indivíduo que diante de tanta transformação interna (involuntária) e externa (também involuntária dada a sua formação no meio social) vê-se diante de dilemas a serem dirimidos.
Fica então para nossa reflexão a pergunta inquietante e incessante: Qual o currículo a ser empregado em sala de aula? Como levar este adolescente a tornar-se autocrítico?
Não se pode atribuir à escola todo o conhecimento adquirido pelo adolescente. No meio social em que nasce e cresce interagindo com integrantes da família e vizinho - que são geralmente seus primeiros agentes de interação - o adolescente adquire saberes que só é comum àquele meio. Assim quando ele chega à escola tem conhecimentos de muitas regras, conceitos, preceitos, no entanto, hoje a escola chamou para si esta responsabilidade. Sabedor que o adolescente ao chegar à escola com conhecimentos diversos fruto da cultura do meio em que vive o educador deverá conciliar o currículo estabelecido e a sua cultura.
É o currículo que se apresenta na forma escrita, como uma norma a ser seguida pelos professores, geralmente apresentando fundamentação teórica, concepção pedagógica apontando formas de ensinar, incentivando alguns procedimentos e desaconselhando outras.
É comum ver que ao final de um período escolar tal currículo apresentado no início já está impregnado de fazeres diversos como reforços de condutas racistas, sexistas, elitista etc; São domesticados emoções, desejos e a regulação das situações e possibilidades de afeto entre outros que dependendo do grupo formado e das condições sociais do momento o currículo terá que dar lugar à alguma aplicação extra que viabilize, por exemplo, apaziguar possíveis conflitos de violência que esteja acontecendo.
Uma resistência natural aos currículos impostos pelas redes de ensino público dá-se pela grande complexidade da diversificação de culturas de várias localidades. Como já dissemos anteriormente a cada instante o adolescente é levado a adaptar-se ao modismo, pois se assim não o fizer estará fadado a exclusão do grupo a que pertence. Pais e professores responsáveis pela educação deste jovem vêem-se, muitas vezes impotente para driblar as mazelas criadas por eles dadas as influências externas e a necessidade que tem em ser incluído no grupo. Esse modismo nada mais é do que a cultura desse grupo que teima a todo instante mudar. Então se muda o currículo para adaptar-se aos novos fazeres desses alunos adolescentes. Ressalta-se, no entanto que o currículo não mudará com tanta destreza/rapidez como muda a cultura do jovem, pois a dinâmica das relações sociais dá-se mais rapidamente Neste sentido um currículo cristalizado de pouco ou nada valeria se não levasse em conta a cultura juvenil e todo o seu dinamismo e complexidade. No entanto vale ressaltar que esse dinamismo pode variar no sentido do que se quer com a sua rápida ou sua lenta assimilação.
Por isso o currículo deve levar em conta os traços culturais do indivíduo e toda sua história: as descendências étnicas e culturais, os gêneros humanos; orientações sexuais; status social e poder aquisitivo; as dificuldades e interações apresentadas pelos portadores de necessidades especiais: as etnias; os diferentes grupos de convívios e ambientes culturais de adolescentes e jovens; orientações religiosas; os padrões estéticos e aspectos físicos de cada indivíduo dentro de sala de aula. As instituições escolares poderão ainda promover situações de interação, onde a presença de diferenças se manifeste e seja enfrentada nas suas diferentes conjunturas e representações. E mais: os conteúdos, ao expressar experiência social acumulada, devem também contemplar as experiências da diversidade de ambientes culturais das alunas e alunos para orientar as atividades pedagógicas em sala de aula.
Nesse sentido as instituições escolares são ambientes multiculturais onde deverão ser trabalhados os diálogos entre as diversas culturas. O convívio dos alunos e alunas assim como entre o professor e os alunos deverão ser de harmonia cultural. O professor de posse dos conhecimentos e conflitos existente entre adolescentes que querem se auto-afirmarem existente nas escolas trabalhará os fazeres culturais do aluno e toda sua teia de conhecimentos adquiridos em diversas mídias, quebrando as corrente culturais existentes e atando-as uma às outras entre esses grupos de jovens.
O professor deverá levar em conta que os adolescentes que freqüentam as instituições escolares expressam a sua cultura vivida e são portadores de saberes produzidos em seus grupos de convívios. Estes saberes, comumente, guardam em si muito da experiência vivida. Assim as tradições míticas e folclóricas estarão presentes nos fazeres destes adolescentes e trazem à sala de aula produtos da indústria cultural veiculados pela cultura de massas assim como saberes acessados em diferentes pontos das mídias. O acesso a internet, os vídeos games, permite que o indivíduo ao acessá-los se interesse pelos modos de como são feitos, lê suas regras, os seus passos-a-passos de como acessar, as viabilidades de acesso e as percepções de que existem várias maneiras de se escolher caminhos para se chegar a vários lugares, entre outros; a televisão que exibe diferentes tipos de acesso em função da variedade de oferta de programas; As mídias impressas e sites da Internet veiculam publicações, assim como rádios e canais de televisão produzem programas dirigidos a adolescentes que acessados por alguns, são transmitidos oralmente para vários outros.
É nessa perspectiva que a identidade de adolescentes não pode ser desprezada e nem desqualificada pela instituição escolar, pois tais expressam padrões de convívios, que articulam valores, condutas e linguagens que podem assegurar harmonias ou conflitos se não forem bem trabalhados.
Como vimos não dá para se fechar num currículo e fazer de conta que as pessoas têm a mesma cultura e delas usufruem passivamente.
Então o educador dobrará sua atenção, pois o caminho a ser percorrido terá que ser o de conciliação.
Outra particularidade que nos chama a atenção são os diálogos que podem ser o cerne das divergências. Uma frase, um apelido, uma explicação, um olhar que pode significar algumas palavras numa determinada comunidade pode ser interpretada de uma forma diferente na outra. Como as atitudes, as regras, a forma de saudar podem ser diferentes. Detectado essas anomalias o educador se utilizará de ferramentas que podem partir de uma simples conversa e ir até um projeto que enfatize as divergências existentes.
As propostas curriculares não podem ser “engessadas”. As instituições, seja ela pública ou particular, deverão impregná-las de possibilidades onde o educador terá mobilidade para viabilizar o ensino para esses jovens conforme cada grupo que se formam ano após ano e momento após momento dado a dinâmica que os acontecimentos se dão em nossos dias.
O educador por sua vez deverá se empenhar em ter a sensibilidade e convicção daquilo que pretende passar aos seus educando para que não se perca em suas próprias palavras ou caia no vazio não tendo a certeza daquilo que se quer fazer. É importante ao educador se questionar ao planejar uma estratégia de intervenção: pra quê? Pra quem? Por quê? Devem permear a vida profissional do educador.
Outro aspecto a ser considerado é do próprio estado físico que é constituído a escola. As suas dependências e critérios de utilização são diferentes em cada região. E para ser mais específico, muda de uma entidade para outras. Cultura do uso das instalações que se modificam agindo sobre o indivíduo que terá que conjugar as várias formas dos fazeres e o seu desprendimento em relação ao ensino. Tais especificidades é bem visíveis quando o indivíduo é transferido de uma escola para outra. Mas para ser mais claro tomamos como exemplo o filme “O Jarro”. É de extrema diferenciação o comportamento do professor e dos jovens alunos e de seus pais por conta de um vasilhame de água importante para o funcionamento da escola. Todo um drama é vivido desde a sua quebra, a sua nova aquisição e o seu transporte, pois a necessidade deste utensílio era de fundamental importância para o funcionamento da escola.
Fomos ao Irã na captura de um exemplo, mas debaixo de nossos olhos estão ocorrendo outras necessidades que não percebemos e que fazem parte ou que serão inseridos no cotidiano do aluno.
Outro aspecto a ser considerado pelo educador diz respeito ao que ele fala ou dar exemplos, pois o que parece corriqueiro a um, não se traduz em nada para o outro. Nessa percepção que traduz os fazeres dos alunos é que deverá traçar uma linha de pensamento que englobe toda cultura existente em sala de aula de modo que todos possam ser atingidos por sua fala.
Exemplo simples é quando o professor cita alguma passagem em filme, novela, etc... Que foi exibido no canal de televisão “X”. Pode ser que nem todos tenham a cultura de assistir novelas ou filme na televisão ou não têm o aparelho em casa. Logo a sua fala é vã. Não conseguiu unir as várias formas de culturas existentes em sala de aula.
Nesse sentido é que devemos pensar na necessidade de se reinventar a escola, local de conflitos sim, de experiências e conciliação que pode englobar fazeres diversos sim, mas torná-lo um local de negociação e troca de conhecimentos pode e deve ser o objetivo primeiro de quem cogita dela fazer o seu lócus de aprendizado.
A escola está chamada a ser, nos próximos anos, mais do que um lócus de apropriação do conhecimento socialmente relevante, o científico, um espaço de diálogo entre diferentes saberes científicos, social, escolar, etc. – e linguagens. De análises crítica, estímulo ao exercício da capacidade reflexiva e de uma visão plural e histórica do conhecimento, da ciência, da tecnologia e das diferentes linguagens. (CANDAU, ano? p.14)
Assim se prosseguirmos os exemplos seriam intermináveis, mas os olhares atentos do educador terão que transpor as barreiras impostas pela cultura diversificada. Se não unindo ao menos conciliando de maneira harmônica os saberes diversos dentro de uma sala de aula.
Aos que se propõem a elaborar um currículo que o façam com sensibilidade e deixando sempre margens à inserção de novos fazeres dada a diversidade cultural encontrada em sala de aula e que poderá ser trabalhada em beneficio de todos.
Ampliando a discussão, em respeito ao fragmento textual de Moacir Gadotti no início desse artigo, é pertinente reafirmar que a discussão pode e deve ampliar para âmbito internacional. Aliás, já é lei onde se insere a cultura africana no currículo escolar. Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que "altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, onde se insere "estudo da História da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil" (art. 26-A, § 1º).
Assim particularizar a questão do adolescente no ensino escolar e seus conflitos é de suma importância, mas não esquecer que os conflitos multiculturais transcendem fronteiras e que também devem ser compreendida como indispensáveis para entender as culturas locais.
REFERÊNCIA
CANDAU, V. M. ano? p. 14.
SILVA, Tomás Tadeu. “Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do currículo”. Belo Horizonte; Autêntica, 2002. p. 85-90.
CORDIOLlI, Marcos. Disponível em http://www.adolescencia.org.br/portal_2005/secoes/saiba/saiba_mais_corpo.asp?secao=saiba&tema=corpo. Acessado em 7/10/2010 às 21:35h.
MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa. Currículo, diferença cultural e diálogo. Educ. Soc. [online]. 2002, vol.23, n.79, pp. 15-38. ISSN 0101-7330.